• Para além da sala de aula: como o estado de Pernambuco tem atuado para garantir educação pública de qualidade e inclusiva para as pessoas com deficiência

    Para além da sala de aula: como o estado de Pernambuco tem atuado para garantir educação pública de qualidade e inclusiva para as pessoas com deficiência

    A educação inclusiva não é apenas um conceito pedagógico. É a garantia do direito de todos os cidadãos terem acesso à educação. Ela gera não só a igualdade de oportunidades, mas abrange diversidades étnicas, sociais, culturais, intelectuais, físicas, sensoriais e de gênero, e promove a mudança de hábito e a transformação cultural, conscientizando a população sobre práticas de inserção.

    No Brasil, o cenário da educação inclusiva reflete desafios que perpassam, sobretudo, pela complexidade do sistema educacional, os estigmas sofridos pelas pessoas com deficiência (PCD) e a falta de políticas públicas eficazes que leve para sociedade o conhecimento necessário para aplicar a inclusão social das PCD, além de investimentos financeiros nesta pauta. De acordo com dados do módulo Pessoas com Deficiência, da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua 2022, cerca de 18,6 milhões de pessoas de 2 anos ou mais de idade do país têm algum tipo de deficiência.

    Os números, no entanto, são ainda mais preocupantes quando se observa a taxa de analfabetismo: no terceiro trimestre de 2022, ela chegou a 19,5% entre pessoas com deficiência, enquanto, para pessoas sem deficiência, essa taxa foi de apenas 4,1%. A pesquisa também destaca que apenas 25,6% das pessoas com deficiência concluíram o Ensino Médio, em comparação com 57,3% das pessoas sem deficiência. No Ensino Superior, a situação é ainda mais crítica: apenas 7% das pessoas com deficiência conseguem finalizar o processo educacional.

    Esses números deixam claro que, ao longo da jornada educacional, ocorre uma queda expressiva no número de pessoas com deficiência que conseguem concluir sua formação. Para entender melhor o impacto dessa realidade, a equipe da Eficientes conduziu entrevistas entre julho e agosto com pessoas com deficiência das periferias do Recife e com gestores públicos. O resultado desse trabalho foi uma reportagem especial e uma websérie de seis episódios, disponíveis em nossas redes sociais.

    “Eu tenho alguns amigos, mas a maioria da classe não se aproxima muito de mim, mas os professores estão sempre dando um jeito de me ajudar”. A fala que inicia esta reportagem foi dita por Laís Rodrigues da Silva, uma jovem de cabelos longos, lisos e pretos.

    Aos quatro anos, ela contraiu uma doença rara que atingiu a sua retina e foi diminuindo os níveis de visão. Hoje, aos 15 anos, ela tem cegueira total.

    Motivada por sua mãe, Laís cresceu entendendo que o preconceito e a falta de acessibilidade não tornariam sua vida fácil. Mas sempre teve certeza de que nada lhe é impossível. “Ela sempre disse que não ia ser fácil, que as pessoas poderiam me olhar diferente, me tratar diferente e achar que eu não sou capaz, mas ela sempre disse que eu posso fazer tudo que eu quero. Eu aprendi a andar de bicicleta sem rodinha sozinha, eu já participei da colônia de férias do horto, minha mãe me ensinou a pular corda, fiz natação, aula de piano, ballet”, contou.

    Ela cursa o primeiro ano do ensino médio na Escola de Referência em Ensino Fundamental e Médio Joaquim Xavier de Brito, no bairro da Iputinga, no Recife, local onde aconteceu a entrevista. Ao entrar na escola, no lado direito, há uma rampa, e corrimãos onde estão presas várias bicicletas. A escola possui várias pilastras, e logo em seguida, nos deparamos com uma escada que leva à sala de recursos com quatro computadores, um bebedouro, um armário e uma estante com vários jogos acessíveis. Apesar de ser uma unidade de referência, a escola não dispõe de alguns recursos importantes para garantir a acessibilidade arquitetônica, como o piso tátil, um elemento tão importante para dar maior autonomia e segurança às pessoas cegas, já que marca o caminho que ela precisa para entrar em determinados locais.

    Laís não usa bengala e sempre conta com o apoio de alguém para se locomover dentro das dependências da escola. Para a entrevista, ela foi trazida pelo seu pai até a sala de Recurso, um ambiente que dispõe de materiais educacionais acessíveis e os profissionais que aplicam as metodologias de acessibilidade. No fim da conversa, ela foi acompanhada por um amigo até outro espaço da unidade.

    Fotografia uma menina negra, com cabelos longos e pretos, vestindo uma camisa branca com detalhes em azul, amarelo, verde e vermelho, que identifica a Rede Estadual de Ensino de Pernambuco. Ela está sorrindo e está em uma sala organizada, com estantes ao fundo contendo vários objetos, como caixas plásticas, instrumentos e materiais educativos.
    Laís precisa de apoio para circular pelos ambientes da escola.

    Perguntada sobre a principal dificuldade que enfrenta no colégio, ela ressalta a solidão. “Eu acho que talvez pela falta de inclusão, os meninos parecem, sei lá, ter medo de se aproximarem de mim ou por não saber como me ajudar. E termina muitas vezes me ignorando e isso é doloroso. É bem ruim a dor da solidão e várias vezes eu falei na escola: ‘gente, eu sou normal’”, contou.

    Na escola, a estudante tem o suporte de uma professora braillista, que recebe todas as atividades realizadas pelos professores de Laís e a encaminha em braile. “Isso é bem legal, porque eu não preciso de alguém a todo instante perto de mim. Minha mãe é muito ocupada e não dá para ficar todo tempo pedindo ajuda dela, então a tarefa em braile é importante porque a qualquer hora eu posso fazer, responder e entregar aos professores”, pontuou.

    Focada em finalizar o ensino médio e a estudar algum curso universitário que trabalhe a biologia, Laís conta que ainda não pensou muito sobre sua entrada no mercado de trabalho. “Eu acho que pode ter alguma dificuldade nesse acesso, mas como tudo na vida vou vencer. Acredito nisso, eu penso isso. Eu vou fazer um curso na faculdade e depois vou dar um outro passo. Um de cada vez, mas sempre vencendo os obstáculos”, disse.

    UNIVERSIDADE É AINDA MAIS HOSTIL

    “Quando o professor me deu a prova com a fonte normal, eu o chamei e expliquei que não conseguia identificar as palavras. E ele disse: ‘se vire. Você que sabe se vai fazer a prova ou não. Você está deficiente visual, não era nem para estar aqui’. Ele virou e voltou a observar os outros alunos, e eu fiquei com a prova na mão sentada na cadeira, raciocinando sobre o que tinha sido me dito”.

    O relato que inicia esta segunda parte da reportagem é de Elaine Silva, uma jovem negra de 26 anos que perdeu a visão aos 18 anos após uma hidrocefalia. Elaine é o nome fictício escolhido por ela que, por receio, preferiu não se identificar e nem apontar a instituição de ensino superior pernambucana onde foi palco de uma das experiências mais tristes que vivenciou.

    Na época estudante de Educação Física em uma universidade pública, Elaine foi socorrida para a emergência hospitalar com fortes dores de cabeça exatamente no dia do retorno às aulas. No hospital, ela passou por uma cirurgia na cabeça para a drenagem do líquido, mas ficou em coma por pouco mais de dois meses. Ao acordar, não conseguia enxergar. “Quando eu saí de casa, eu enxergava. Quando acordei do coma, que vi a escuridão, fiquei em dúvida se eu estava acordada. Mas aí ouvi a voz da minha mãe”, contou.

    Amante da leitura e dedicada aos estudos, após a alta hospitalar Elaine não trancou a matrícula na faculdade. Um ano depois, decidiu que voltaria ao curso e foi até a coordenação da universidade com sua mãe entender se o retorno seria possível. “Minha mãe alertou à faculdade que eu precisaria de alguém para me auxiliar nas avaliações ou que eu precisaria de provas com fontes maiores e um tempo maior para fazer. Na época, eu conseguia enxergar um pouco. Voltei ao curso e entrei em quatro disciplinas”, disse.

    No entanto, em uma das avaliações, não foi cumprido o combinado feito com mãe e filha. Elaine recebeu uma prova com fonte pequena e não houve a opção de assistência. “Fui vendo que os alunos estavam saindo e vi que não tinha como fazer a prova. Com as linhas muito unidas umas nas outras, eu não conseguia entender. Eu simplesmente entreguei a prova, sem nem escrever meu nome, e sai da sala bem abalada”, afirmou.

    O episódio fez Elaine desistir do curso. Mas o desejo pela formação superior seguiu latente, fazendo com que, anos depois, ela se matriculasse em outra instituição de ensino. Hoje, ela cursa o oitavo período do curso de Nutrição em uma faculdade particular, longe da instituição onde foi vítima do capacitismo, mas conta que as dificuldades com a falta de acessibilidade continuam. ”Falta de empatia e falta de acessibilidade vão existir em todo canto. Essa faculdade que estou hoje também disse que ia garantir todos os artifícios, todo o suporte que eu precisasse. Mas também não é assim”, apontou. “É difícil a sociedade tratar a acessibilidade. É difícil a gente tratar a empatia. A gente tem que trabalhar esses temas desde pequeno, para quando a gente crescer, aplicar e incluir às pessoas com deficiência”, destacou.

    card com fundo laranja e amarelo. Em letras brancas do lado direito tem: "nível de educação das pessoas com deficiência, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua de 2022". Abaixo um  gráfico de barras apresenta três estatísticas: 36,7% das pessoas com deficiência têm nível de escolaridade representado por um ícone de mochila, 25,6% têm nível superior, indicado por um ícone de livro aberto, 7% têm formação avançada, ilustrado por um gráfico matemático. Há ícones de figuras humanas com deficiência física, auditiva e visual abaixo das barras. Uma seta laranja inclinada para baixo conecta os diferentes níveis educacionais.
    Apenas 7% das pessoas com deficiência concluem o Ensino Superior
    Crédito: Carlos Pontes

    Questionada quais seriam as acessibilidades que deveriam ser aplicadas na instituição de ensino em que estuda, ela inicia a resposta ressaltando a inacessibilidade que começa desde a saída de casa. “O caminho de casa até a faculdade é um grande desafio. Calçadas com buracos, falta de sinalização. Vou sozinha, então, às vezes, tem algumas crianças no caminho que me param e dizem “moça, deixa eu ir com você; você vai bater no poste”. E eu digo que não tem problema, que se eu bater, vou aprender e decorar que naquele lugar tem um poste ali, que eu não posso passar mais ali. Minha perna está toda manchada e isso tudo é pancada que eu levo na rua. Na minha rua mesmo, vocês viram as calçadas, né?!”, perguntou à equipe de reportagem.

    Elaine mora no bairro do Bongi no Recife, não muito longe do campus da insituição onde estuda, local de casas simples e ruas e calçadas desniveladas e estreitas, o que a impede de se locomover com segurança e autonomia. Os dados do IBGE informam que o bairro tem taxa de alfabetização de 92,3% e renda mensal por domicílio de R$ 1.860,98.

    Na faculdade, ela destacou que o mais difícil é a falta de livros acessíveis. “Seria muito importante encontrar alguns livros específicos da minha área no formato digital”, apontou. Na parte física da instituição, ela apontou a falta de piso tátil em todas as dependências da unidade de ensino e indicou a falta de manutenção nos recursos de acessibilidade que foram aplicados. “As escadas têm fitas antiderrapante, mas estão desgastadas e, apesar dos computadores terem os softwares de leitor de tela instalados, não temos o suporte de uma pessoa para nos ajudar”, afirmou. “Mas tudo isso é construção e esse tipo de construção demora muito. E não sou eu, Elaine, quem vai mudar isso. Quando todo mundo parar dizer assim ‘a gente tem que mudar isso’, é que vai mudar realmente. Mas eu acho que ainda vai demorar séculos e séculos, é muito lento para ter uma solução”, completou Elaine

    COMO ATUA O GOVERNO DE PERNAMBUCO

    Em 2015 foi instituída a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência para assegurar e promover, em condições de igualdade, os direitos e as liberdades fundamentais das pessoas com deficiência, visando à sua inclusão social e à cidadania. Dentre as diretrizes estabelecidas pela lei de inclusão, o artigo 28 determina que é incumbência do poder público assegurar, criar, desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar o sistema educacional inclusivo em todos os níveis e modalidades, bem como o aprendizado ao longo de toda a vida. No entanto, segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), apesar da inclusão escolar ter avançado nos últimos anos, ainda há desafios significativos na implementação de práticas efetivas que atendam a todos os alunos equitativamente.

    Em Pernambuco, há aproximadamentee 14 mil estudantes com deficiência matriculados nas 1.601 escolas estaduais. Desse número, 549 unidades dispõem de salas equipadas com recursos acessíveis, como impressoras em braille, itens pedagógicos, mobiliários acessíveis e outros, e apenas 192 estão totalmente adequadas à acessibilidade.

    De acordo com a Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco, a meta é que, até o final de 2026, todas as escolas do estado sejam acessíveis. “Desde 2004, com a própria organização da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) e a Lei de Acessibilidade, a gente vem brigando para que cada vez mais os prédios públicos se tornem acessíveis. Nós temos estruturas nas nossas escolas de prédios antigos, mas hoje a gente tem Investe Escola e geralmente a gente foca e dá prioridade para esses pontos de acessibilidade arquitetônica”, apontou a gerente estadual de Educação Inclusiva, Sunnye Gomes.

    fotografia de uma mulher branca, com cabelos loiros presos, usando óculos grandes, vestindo uma blusa azul e um casaco preto por cima. Ela está sentada em um sofá preto e usa colares e anéis dourados. Ao fundo, há estantes com livros e cartazes nas paredes.
    Sunnye é gerente de Educação Inclusiva de Pernambuco
    Crédito: Larissa Pontes/Eficientes

    O Programa Investe Escola Pernambuco (Piepe), citado pela gestora, promove a manutenção e a melhoria das infraestruturas física e pedagógica das unidades escolares. Em matéria publicada no site da secretaria em 24 de janeiro de 2024, há o indicativo de que o Governo do Estado liberou R$ 101 milhões para serviços de infraestrutura das unidades para 2024.

    Sobre o orçamento estadual total previsto para a educação inclusiva, a SEE informou que do segundo semestre de 2024 ao segundo semestre de 2025 serão investidos R$ 13.060.873,48. Em relação à formação de professores, a gerente de Educação Inclusiva do Estado, destacou que a meta do ano é capacitar 1.754 professores da Educação Especial. Ela destaca que há o convite para que os professores da educação regular e outros profissionais das unidades escolares também se capacitem. “A gente inicia o nosso movimento de formações continuada desde o início do ano. Nas nossas formações, a prioridade é para os professores do Atendimento Educacional Especializado, mas convidamos sim professores da sala comum, porque a gente acha importante esse diálogo. A gente quer que esse professor chegue mais perto da gente, porque, na verdade, o aluno está mais tempo na sala de aula regular. Então, há o convite para esses professores também, assim como a gente mobiliza a equipe de gestão, os educadores de apoio e outros agentes, outros protagonistas da escola”, afirmou.

    Para a gerente de Educação Inclusiva do Estado, Sunnye Gomes, Pernambuco se destaca por oferecer o Atendimento Educacional Especializado (AEE). “A estratégia mais forte, que é uma grande marca do nosso Estado, é a garantia do Atendimento Educacional Especializado. Sem a garantia desse atendimento é praticamente impossível efetivar uma inclusão. Então essa é a nossa maior estratégia e com isso, obviamente, você tem alunos surdos inclusos, com intérpretes de libras em sala de aula. Se temos alunos cegos, há professores braillistas. Então, o aluno matriculado na unidade escolar ele tem a garantia da oferta do Atendimento Educacional Especializado”, pontuou.

    Mas é importante ressaltar, que a Lei da Inclusão, ainda em seu artigo 28, determina que é dever do poder público construir e oferecer um projeto pedagógico que institucionalize o Atendimento Educacional Especializado para atender os estudantes com deficiência. “A educação é um processo contínuo de aprendizagem. São 30 anos de educação especial, eu vim de internatos e hoje falo de inclusão de estudantes cegos. Não tenho como dizer que a gente não avançou. A gente avançou muito, mas ainda precisamos melhorar mais. Acredito muito no que a gente está construindo e eu sei o que a gente está crescendo”, atestou a gestora.

    FALTAM AÇÕES AFIRMATIVAS

    Em relação ao ensino superior, o Governo do Estado atua através da Universidade de Pernambuco (UPE). O pró-reitor de Graduação da UPE, Ernani Martins, afirma que a primeira iniciativa inclusiva acontece nos processos seletivos onde o candidato pode indicar sua demanda, apresentar o laudo e ter garantido uma equipe técnica para dar condições necessárias. “Por exemplo, um candidato com deficiência intelectual que às vezes necessita usar um computador específico. Ele faz o requerimento, traz o equipamento e esse computador é analisado por uma equipe técnica que vai atestar que aquilo que ele pede é uma condição necessária e que não será uma vantagem em relação aos outros candidatos”, explicou.

    No entanto, no ingresso à instituição, o pró-reitor ressalta que ainda não há uma ação afirmativa específica para estudantes com deficiência que queiram ingressar nos cursos de graduação, pois a lei de Cotas obriga apenas as universidades federais e concursos públicos. “A gente vem trabalhando paulatinamente, discutindo com o governo estadual as condições para que a gente faça isso, como melhorar toda a infraestrutura física”, pontuou, reforçando que o mesmo não se aplica nos cursos de pós-graduação. “Já tem uma ação afirmativa, uma cota específica para pessoas com deficiência que queiram fazer mestrado e doutorado”, disse. De acordo com dados de 2023, a UPE tem cinco estudantes com deficiência auditiva, seis com deficiência física e 66 estudantes com deficiência visual, sendo baixa visão, monocular e outras. Ao todo, a universidade tem 14 mil alunos.

    Ernani destacou ainda que a universidade não tem profissionais específicos para atuar na aplicação das acessibilidades necessárias no dia a dia dos estudantes com deficiência, mas indica que há formações sobre acessibilidade e inclusão para os docentes compreenderem como atuar com os alunos com deficiência, tendo 25% do quadro docente com alguma formação específica sobre os temas este ano. “A gente precisa ter uma lei que crie cargos na universidade de intérprete de libras, tradutor, braillista e outras não têm, então não podemos fazer concurso. Mas a gente pretende até 2027 ter todas essas necessidades para as políticas públicas avançarem na instituição”, afirmou.

    Fotografia de um homem branco, usando óculos e uma camisa polo preta com pequenos pontos brancos. Ele está sentado à mesa, em frente a um notebook. Ele sorri para a câmera e tem uma xícara ao lado, com persianas de fundo.
    Martins, pró-reitor da UPE, acredita ser possível adequar infraestrutura
    Crédito: Larissa Pontes/Eficientes

    Apesar disso, o gestor frisa haver estudantes com deficiência na UPE e que, quando o aluno necessita de tecnologias assistivas, são ofertadas pela instituição os recursos e equipamentos necessários “Quando eles entram, a gente faz um estudo para entender sua condição e ofertar uma formação equitativa, respeitando as características de cada curso”, afirmou.

    Diferente do ingresso para a formação universitária, a UPE aplica a política de cotas afirmativas no processo de seleção profissional, garantindo o percentual determinado por lei para a contratação de pessoas com deficiência. “Quando elas passam no concurso e são convocadas, depois da junta médica, tem uma equipe que acolhe na pró-reitoria de Desenvolvimento Pessoas para entender as necessidades dessas pessoas e alocar no setor que vai atuar e dar toda a infraestrutura do que é possível dentro da universidade para que essa pessoa trabalhe da melhor forma possível”, disse.

    Para sanar as faltas de acessibilidade na instituição, a Universidade de Pernambuco instituiu em 2021 o Núcleo de Acessibilidade e Inclusão. “Ele funciona dando essa assistência em várias direções, em apoio psicopedagógico, em equipamentos, para que a gente tenha, de fato, um tratamento equitativo para todos os alunos que estão nas graduações da universidade, em todas as macrorregiões do estado onde a UPE está distribuída”, detalhou indicando que a perspectiva é que até 2027 o núcleo seja ampliado. “O objetivo maior é a gente não só dar o acesso à universidade, mas instituir a permanência dessas pessoas, entendendo a universidade como um espaço plural para todas as pessoas.”

    Embora a ampliação do Núcleo de Acessibilidade e Inclusão seja um passo na direção certa, é necessário questionar por que os processos de implementação de acessibilidade avançam tão lentamente. O núcleo existe desde 2021, mas só em 2024 foi possível iniciar a capacitação dos professores. E isso não se limita a UPE; é importante que outras instituições exerçam políticas inclusivas, como a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e a Universidade Rural de Pernambuco (UFRPE), que não forneceram à equipe de reportagem os questionamentos sobre suas políticas de inclusão. Será que há, de fato, um comprometimento das instituições de ensino e do poder público com a criação de um ambiente acadêmico inclusivo e acessível?

    Uma coisa é certa: a implementação de ações que promovam a inserção e permanência de estudantes com deficiência não deveria ser uma exceção, mas sim uma regra. No entanto, ainda há um longo caminho para que esse compromisso se transforme em práticas consistentes e eficazes, capazes de gerar um impacto real na sociedade, fortalecendo a diversidade e garantindo a equidade no ensino médio e superior, ao invés de cumprir apenas metas institucionais.

    E NO MERCARDO DE TRABALHO?

    Roberta Soares, professora de libras, sempre foi incentivada pela família a estudar. Para isso, até o ensino médio, frequentou uma unidade de ensino particular e bilíngue, onde existiam alunos surdos e professores que se comunicavam na língua de sinais. Após esse período, ela foi matriculada na Escola Técnica Estadual Professor Agamenon Magalhães (Etepam) e passou a vivenciar os problemas que a falta de inclusão na sociedade gera às pessoas com deficiência, sobretudo aos surdos.

    Ela conta que no começo a escola não disponibilizou intérprete de libras e nenhum professor sabia a língua de sinais. “Os surdos ficavam lutando para conseguir esse profissional, que chegou depois. Mas o ensino médio foi difícil, foi tudo diferente do que eu tinha vivido. A maioria dos alunos eram ouvintes, a metodologia de ensino não era a mesma. Mas eu me esforcei, estudei, fiz reforço, principalmente para matemática e química, e consegui passar por essa fase”, pontuou.

    Com o ensino escolar concluído, Roberta foi em busca de um trabalho numa fábrica. E nessa etapa, ela enfrentou novos desafios. “Foram nove anos nesse emprego e, para as pessoas com deficiência é bem difícil, tem muitas barreiras, muito preconceito e tinha muito impedimento comunicacional. Minha ideia sempre foi evoluir, sair de lá e me formar professora efetiva”, contou. Foi então que, conciliando com o emprego fabril, ingressou na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) para cursar o primeiro curso de Letras Libras.

    Para Roberta, entrar na UFPE não foi algo difícil. A prova para o vestibular era toda em libras e o curso tinha apenas alunos surdos. “Me lembrou a escola bilíngue e eu não tive dificuldade. A gente teve disciplinas de português, para praticar a leitura, mas o professor sabia libras, os trabalhos eram feitos nessa linguagem”, ressaltou. Sobre a equipe administrativa da universidade, ela destacou que, em 2008, ano em que iniciou o curso, não existia uma estrutura inclusiva completa. “A coordenação não sabia libras, mas os professores que sabiam apoiavam e tinha os intérpretes também, além de grupos de ouvintes que sabiam libras e grupos de surdos. Com o tempo, eles foram evoluindo e hoje, em 2024, melhorou muito”, reforça. “Lembro que, na minha época, tinha uma mulher surda no curso de Matemática e foi muito difícil para ela”, completou.

    Durante os estudos na graduação, Roberta mirava para o futuro: sua meta seria estudar e ser aprovada em um concurso público. “Hoje, sou professora da rede estadual”, contou. Como docente de libras, ela ensina pessoas ouvintes e surdas, mas já teve experiência com pessoas cegas. “Foi um desafio para mim, por que fiquei pensando ‘qual material irei utilizar?’. Porque existiam várias possibilidades, acabou sendo difícil no início. Mas foi importante para mim, porque aprendi a trabalhar, mudar a estrutura de trabalho e pensar nas adaptações”, afirmou. A partir das vivências no trabalho, Roberta destacou que vão se criando ferramentas para ultrapassar os desafios que o mercado de trabalho apresenta. Mas será que recorrer ao concurso público será a única perspectiva de futuro para as pessoas com deficiência no mercado de trabalho?


  • Plano Conjunto promove interação entre Cinema, Educação e Acessibilidade

    Plano Conjunto promove interação entre Cinema, Educação e Acessibilidade

    Projeto realiza sessões de cinema acessível e atividades formativas a partir de terça (07/05)

    Cinema, Educação e Acessibilidade são áreas interligadas que, juntas, possuem um grande potencial para fortalecer a inclusão, a diversidade e as oportunidades. A partir dessa perspectiva, surge o Plano Conjunto, um projeto com o objetivo de realizar sessões de cinema acessível e atividades formativas, como oficinas e masterclasses. 

    O principal público-alvo são os estudantes com deficiência das Escolas Municipais do Recife, bem como profissionais do cinema, da acessibilidade, professores, técnicos e gestores escolares. As sessões de cinema acessível são abertas ao público em geral.

    A programação é dividida em três ciclos, que acontecem a partir de hoje (07/05) e se estendem até junho. As atividades são realizadas gratuitamente. O projeto é realizado pelo produtor Túlio Rodrigues com incentivo pelo Sistema de Incentivo à Cultura/Prefeitura do Recife. 

    Projetos como este são importantes para a sociedade compreender a importância da acessibilidade no contexto cultural e educacional. De acordo com dados da Gerência de Educação Especial da Cidade do Recife, no ano de 2023, aproximadamente 4.500 alunos com deficiência estão matriculados na Rede de Ensino do Recife. Dentre eles, 1.031 estudantes possuem Transtorno do Espectro Autista (TEA), 306 têm Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), 196 apresentam surdez ou algum grau de deficiência auditiva, 111 possuem cegueira ou baixa visão, e 112 têm síndrome de Down.

    Foto: Divulgação

    O primeiro ciclo do Plano Conjunto inicia com a exibição da animação “Além da Lenda”(Classificação Livre, 1h26m), de Marcos França e Marília Mafé, na terça-feira (07/05), às 14h30, no Cinema da Fundação (Derby, Recife). O filme é o primeiro longa-metragem de animação produzido em Pernambuco e aborda lendas brasileiras como Saci, Comadre Fulozinha e Curupira. A sessão acessível terá recursos de Audiodescrição (AD) para pessoas cegas e com baixa visão, Língua Brasileira de Sinais (Libras) e Legenda para Surdos e Ensurdecidos (LSE). 

    A sala de cinema funciona em modo adaptado, com o ambiente mais iluminado e o som reduzido, para melhor receber pessoas neurodiversas, o que inclui pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), síndrome de Down, entre outras. O público será acolhido por uma equipe que conta com audiodescritores e intérpretes de Libras e, ao final da sessão, participará de uma mediação acessível.

    A programação ainda conta com atividades que propiciam diálogos sobre cinema, acessibilidade e educação inclusiva. “Durante os três ciclos, o Plano Conjunto oferece encontros com temáticas diferentes, oportunizando o debate da pluralidade do estudante com deficiência e mobilizando discussões específicas sobre cada individualidade”, explica Túlio Rodrigues, coordenador do projeto.

    A masterclass online “Educação audiovisual: percursos criativo-pedagógicos entre escola e comunidade” será realizada na quinta (09/05), às 19h30, com Felipe Leal, da Semente – Escola de Educação Audiovisual (PB). Nos dias 10 e 17 de maio, o Plano Conjunto oferece a oficina Introdução às Legendas para Surdos e Ensurdecidos (LSE) com Deise Medina (BA). Os encontros da oficina acontecem das 14h30 às 17h30, em formato online. Os interessados devem se inscrever através dos formulários disponibilizados através do perfil do projeto no Instagram: https://www.instagram.com/plano.conjunto.lab/

    Plano Conjunto – Laboratório de Cinema, Educação e Acessibilidade

    Programação:
    Ciclo 1:

    07/05, 14h30 – Sessão Acessível no Cinema da Fundação/Derby (AD, Libras e LSE)
    Filme: Além da Lenda, Marcos França e Marília Mafé, Animação, Livre, 1h26m

    09/05, 19h30 –  Masterclass – Educação audiovisual: percursos criativo-pedagógicos entre escola e comunidade com Felipe Leal, Semente – Escola de Educação Audiovisual (PB).

    10/05 e 17/05 (14h30 às 17h30)- Oficina de Introdução às Legendas para Surdos e Ensurdecidos (LSE) com Deise Medina (BA).
    Inscrições na página do instagram: @plano.conjunto.lab
    Link: https://www.instagram.com/plano.conjunto.lab/


  • Educação inclusiva enfrenta obstáculos

    Educação inclusiva enfrenta obstáculos

    O capacitismo está presente em todas as esferas sociais, principalmente na educação.

    OPINIÃO

    Artigo: Larissa Pontes

    Na segunda-feira, 09 de agosto às 21h30 estava começando mais um programa Sem Censura, na TV Brasil. O convidado da noite foi Milton Ribeiro, o Ministro da Educação, que afirmou. “Quando um aluno com deficiência é incluído em salas de aula comuns, ele não aprende e ainda ‘atrapalha’ a aprendizagem dos colegas”. Após as alegações, uma grande indignação foi causada nas pessoas com deficiência. 

    Após dez dias, o Ministro chegou ao Recife para a cerimônia de reabertura do Museu do Homem do Nordeste, da Fundação Joaquim Nabuco, na Zona Norte. Durante a solenidade fez outra declaração atacando as pessoas com deficiência. “Nós temos, hoje, 1,3 milhão de crianças com deficiência que estudam nas escolas públicas. Desse total, 12% têm um grau de deficiência que é impossível a convivência. O que o nosso governo fez: em vez de simplesmente jogá-los dentro de uma sala de aula, pelo ‘inclusivismo’, nós estamos criando salas especiais para que essas crianças possam receber o tratamento que merecem e precisam”, afirmou o Ministro da Educação. Essas afirmações só reforçam o capacitismo que está enraizado na sociedade e são um grande retrocesso para a luta pela educação inclusiva. 

    Em 2019, o Datafolha encomendou ao Instituto Alana, uma pesquisa sobre “ O que a população brasileira pensa sobre educação inclusiva”. Foram entrevistadas 2.074 pessoas acima de 16 anos e colhidas informações de mais de 7.000 brasileiros, de 130 municípios. Segundo os dados, 86% acreditam que as escolas se tornam melhores ao incluir pessoas com deficiência. Para 76%, crianças com deficiência aprendem mais quando estudam com crianças sem deficiência. A inclusão acontece quando pessoas com deficiência e sem deficiência estão convivendo em conjunto, valorizando cada pessoa e aprendendo com as diferenças. Na pesquisa mostra que 93% das pessoas que convivem com pessoas com deficiência dizem que as escolas se tornam melhores quando há inclusão. Esses dados são de grande importância para reafirmar o quanto primordial são as escolas inclusivas. 

    Nas últimas décadas, a educação excluía as pessoas com deficiência, muitas não frequentavam escolas, eram trancadas dentro de casa, ou tinham suas matrículas recusadas. Na década de 40, foram criadas as escolas especiais para que os alunos tivessem acesso à educação, mas reforçam um sistema de segregação e não inclusivo. 

    Entretanto, na década de 90, deu-se início aos questionamentos sobre as escolas especiais e a  discussão sobre educação inclusiva. Porque o sistema educacional passou a enxergar que a deficiência não era um problema e que precisava se adaptar às características de cada aluno. Porém a política de educação inclusiva só foi formalizada em 2008, já que o percentual de alunos com deficiência incluídos em salas regulares era de 54%. Dez anos depois, chegou a 92%, com 1,2 milhão de matrículas em escolas regulares. 

    Apesar dos avanços nas estatísticas, existem grandes obstáculos para que realmente a inclusão seja efetiva. Um deles é o Capacitismo, um termo utilizado para discriminar, oprimir ou diminuir as pessoas com deficiência. Ele está presente em todas as esferas sociais, como: família, educação, ciência, mercado de trabalho, cultura e política. A sociedade antes olhar para as pessoas com deficiência como seres humanos capazes de exercerem suas competências e capacidade, olham a deficiência delas, colocam barreiras e obstáculos para que pertençam à sociedade.

    É importante que tenham debates, eventos, visibilidade, representatividade para que haja uma desconstrução de preconceitos, um grande exemplo disso são as Paralimpíadas. 

    O Brasil levou 259 atletas paralímpicos, que participaram de 20 das 22 modalidades, batendo diversos recordes olímpicos. Nessas duas semanas de paralimpíadas,  fomos capazes de não olhar para a deficiência, mas sim para as capacidades, as habilidades, e também conhecer os esportes e suas funcionalidades. O Brasil ficou entre os dez primeiros países, com total de 72 medalhas, atingindo a sétima posição. 

    Porém, quando analisamos a fundo, ainda percebemos a falta de visibilidade das Paralimpíadas. Podemos destacar vários pontos: nas Olimpíadas a federação de atletas do Brasil levou 302 atletas,  que receberam 21 medalhas em 20 dias, para as Paralimpíadas a federação levou 259 atletas, que receberam 72 medalhas em 13 dias. Um outro ponto bem crítico é o valor das medalhas, enquanto atletas nas olimpíadas receberam 250 mil nas medalhas de ouro, 150 mil nas medalhas de prata e 100 mil nas medalhas de bronze, nas Paralimpíadas chegaram a ganhar 36% a menos, levando 160 mil nas medalhas de ouro, 64 mil nas medalhas de prata e 32 mil nas medalhas de bronze.  

    Na cobertura da mídia das Olimpíadas, a Rede Globo, que é o canal responsável pela transmissão, disponibilizou o canal da TV aberta, quatro canais do Sportv, e o Globoplay. Com coberturas exclusivas e mais 840 horas de transmissões. Já nas Paralimpíadas, o canal da Tv aberta fez um compacto da abertura e de alguns jogos, o Sportv disponibilizou um canal para as coberturas que tiveram só 100 horas de transmissão. 

    A partir dessas análises vimos como as barreiras são colocadas para que as pessoas com deficiência não tenham acesso à educação, esportes e informações. Esses comportamentos da sociedade são atos excludentes e que só reforçam os preconceitos. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2019, analisou o acesso às tecnologias da informação e comunicação, registrou que 63,1 milhões de domicílios tinham televisão com conversor para receber o sinal digital de televisão aberta, que corresponde a 89,8% dos domicílios. Já a TV por assinatura corresponde a 30,4%. Isso quer dizer que 44 milhões de brasileiros ficaram sem acesso à cobertura das paralimpíadas. 

    A representatividade é um dos primeiros passos para combater o preconceito, a partir do momento que não há visibilidade para as paralimpíadas, ou não é promovida uma educação inclusiva, estamos desvalorizando a capacidade das pessoas com deficiência e reforçando os preconceitos. Por isso é de grande relevância que a televisão aberta levante essas pautas, para que a sociedade quebre paradigmas e tenha acesso às informações.


  • Os desafios do ensino online para crianças PCD e a possível volta das aulas presenciais.

    Os desafios do ensino online para crianças PCD e a possível volta das aulas presenciais.

    Entre várias discussões levantadas nesse período de pandemia, a educação tem se tornado um tema central. Muitas dúvidas, questionamentos e posicionamentos opostos tem cercado o assunto. Essa situação está causando diversos impactos no setor. Segundo estudo feito pela Organização Mundial da Saúde, aproximadamente 9,7 milhões de crianças de todo mundo vão abandonar a escola para sempre até o final de 2020. No Brasil, a volta das aulas presenciais começa a ser planejada, qual sua opinião? É seguro retornar para as escolas nesse momento?

    Pensando nisso, o Eficientes conversou com mães de crianças com deficiência para entender como foi a adaptação das aulas online e saber o que elas pensam em relação a retomada do ensino presencial. Renata Martins, é mãe do Bernardo de seis anos e conta como a família está passando pela quarentena.

    Bernardo tem Mielomeningocele e, em função disso é cadeirante. A Mielo é uma condição que afeta a formação da coluna vertebral e traz uma série de complicações físicas e de saúde.
    “Meu filho é incrível, uma criança feliz e ativa. Os tratamentos fazem total diferença no processo de desenvolvimento dele, por isso, ficar sem natação, fisioterapia e escola não é bom, porém diante da possibilidade de contágio preferimos seguir o isolamento total desde março. Somos privilegiados em ter a possibilidade de ficar em casa de forma segura, sabemos que infelizmente muitos não podem fazer isso” – Explica Renata.

    Bernardo realizando exercícios escolares. Foto: Renata Martins

    Ainda segundo Renata, seu filho gosta muito da rotina “Bernardo adora todas as suas atividades, principalmente ir para escola, ele tem um ótimo rendimento escolar e boa relação com amigos e professores. Tudo isso faz falta no cotidiano, mas a adaptação para o ensino online foi tranquila. A escola fez um esquema dinâmico através do uso de fichas, livros e vídeoaulas no Google Meet, eu consigo acompanhar todo esse processo auxiliando-o quando necessário”.

    O que a família acha sobre a possível volta das aulas presenciais? “Em nenhum momento pensamos em suspender a escola, sabemos da importância da mesma se manter, mas ainda não nos sentimos preparados e seguros em mandar nosso filho para a escola de forma presencial, e como ele se adaptou muito bem a esse novo formato então preferimos mantê-lo em casa, com as aulas à distância, evitando o risco de contaminação” – Conclui Renata.

    Cada família tem uma realidade diferente para Sabine Stark, mãe do Guilherme de dez anos o ensino remoto não está sendo fácil. “Guilherme nasceu surdo, com 1 ano de idade fez a cirurgia de Implante Coclear “A princípio pensávamos que o implante traria uma vida “normal” ao Gui, com o tempo aprendemos sobre a surdez e suas nuances. Hoje, o Gui tem a Libras como primeira língua e o normal para nós é respeitá-lo como surdo e indivíduo”.

    No início da pandemia, Sabine e Guilherme sentiram bastante dificuldade para se adaptar a nova rotina de aulas remotas. “Eu fiquei muito assustada com tudo que estava acontecendo, a escola do Gui se adaptou rapidamente às aulas remotas continuando com o conteúdo praticamente normal e eu precisava de um tempo para entender e reorganizar a nova rotina na minha cabeça. No começo ele reclamou muito porque não queria aulas em vídeo, sentia falta do contato com a professora e amigos. Foi preciso muita conversa para entender que isso seria a nova rotina sem data para acabar”.- Conta Sabine.

    Guilherme estuda em uma escola regular que tem salas voltadas ao ensino bilíngue ( libras primeira língua e português escrito como segunda língua), mas a instituição segue o ensino que é voltado para ouvintes. “Mesmo a professora sendo surda, a educação bilíngue no Brasil é muito difícil, faltam materiais, adaptações e conhecimento dos gestores. Eu estava há mais de um ano questionando várias coisas na escola, pedindo algumas mudanças, tentando mostrar as dificuldades que estávamos enfrentando com o passar dos anos. Gui está no 5º ano e o conteúdo só aumenta. Se não temos um respaldo da escola, tudo se torna mais difícil”. – Explica Sabine.

    Guilherme no aprendizados da
    Língua Brasileira de Sinais. Foto: Sabine Stark

    Na Escolas do Guilherme as aulas têm duração de 40 minutos e foram implementadas na plataforma do Google. As lições com explicações em vídeo são postadas também na plataforma, são duas tarefas por dia. Sabine fala os pontos positivos dessa dinâmica “Nesse ponto acho bom porque a questão da concentração é bem difícil assim a distância. Eu tento não sobrecarregá-lo porque sei que não vai adiantar. Ainda mais porque na Libras precisa da atenção total. Um minuto que você olha para outra coisa, quando volta para quem está sinalizando, você já perdeu muito”.

    Sabine acredita que o ensino foi prejudicado “Os danos causados vão se refletir nos próximos anos, as escolas não estavam preparadas para EAD e principalmente pensando nas crianças que demandam outros recursos e adaptações de acessibilidade”. Ela contou que não pretende retornar às aulas presenciais. “Nem agora e nem depois. Eu já avisei a escola que esse ano o Guilherme não volta para aula presencial. Não terá lei que obrigue meu filho a voltar para escola colocando ele e nossa família em risco. Estou atenta as portarias e manifestações do Governo e espero que tenhamos a opção de escolha” – Relata Sabine.

    Realmente esse assunto ainda divide opiniões. Você tem filho, filha ou parentes nessa dúvida? Qual sua opinião? Vamos permanecer atentos para observar o desenrolar de toda situação.


  • Educação e inclusão, o exemplo do Colégio Apoio

    A escola é o primeiro passo para o mercado de trabalho. É nela que os alunos se desenvolvem no meio educacional, depois crescem e exercem uma profissão. Dentro desse segmento, o Colégio Apoio surgiu no Recife com uma proposta de ensino construtivo e não tradicional como era oferecido na maioria das escolas da cidade. A instituição foi uma das primeiras escolas particulares a olhar para as pessoas com deficiência de forma inclusiva, além de se preparar estruturalmente para receber esses alunos.

    A coordenadora e pedagoga do Colégio Apoio, Elisa Maria Araújo Moreira em entrevista ao site eficientes

    Elisa Maria Araújo Moreira é pedagoga, trabalha no Colégio Apoio há 21 anos e atualmente é coordenadora de práticas inclusivas da escola. Ela conta como tudo começou: “Em 2018 o Apoio completa 34 anos e na época de sua inauguração não era muito comum a sociedade olhar e aceitar as pessoas com deficiência, mas essa sempre foi uma preocupação nossa, mostrar que essas pessoas existem e que são capazes. Inicialmente a escola surgiu para atender especificamente esse público, mas com o crescimento nos tornamos um colégio “regular”, explica.

    A partir desse ponto, o Apoio precisou entender como trabalharia a integração entre alunos sem e com deficiência. “Acreditamos que a escola é para todos, então as pessoas com deficiência que estudam aqui são incluídas em sala de aula e podem desenvolver sua aprendizagem. Isso é positivo para eles que se sentem incluídos e veem outras pessoas com deficiência na escola e também é positivo para os alunos sem deficiência que desde crianças aprendem a conviver e respeitar as diferenças”.

    O colégio Apoio deu o pontapé inicial, porém para as pessoas com deficiência ingressarem numa escola continuou sendo complicado. A rede pública de ensino, apesar de muitas vezes não ter estrutura, não pode negar vaga a um aluno com deficiência, mas nas escolas particulares era bem diferente. Seja por falta de estrutura ou apenas por norma institucional, muitos colégios particulares não aceitavam alunos com deficiência. A advogada Walleska Maranhão é ativista dos direitos das pessoas com deficiência e conta uma situação que presenciou do preconceito dos colégios na hora de receber um aluno com deficiência. Confira o áudio:

    Transcrição completa do áudio de Walleska Maranhão

    Em 2015 as coisas começaram a mudar. A elaboração da LBI (Lei Brasileira de Inclusão), que entrou em vigor em 2 de janeiro de 2016, trouxe muitos avanços para as pessoas com deficiência. No campo educacional ficou definido que as escolas particulares são obrigadas a aceitar alunos com deficiência e também devem fazer as adaptações necessárias para receber esses estudantes. Essa conquista demonstra que a sociedade está começando a olhar com mais respeito para as pessoas com deficiência, uma vez que agora eles têm o direito de escolher onde querem estudar.

    Novamente levando em consideração que a escola é o primeiro passo para o mercado de trabalho e mostrando o exemplo do Colégio Apoio, eles também se preocupam com a forma como essa inclusão se dá. “Como empresa, nós acreditamos que a deficiência não impede a pessoa de desenvolver um bom trabalho e sempre tivemos funcionários com deficiência na equipe. Já ocorreram casos de alunos com deficiência que concluíram o ciclo educacional conosco e acabaram trabalhando aqui como “estagiários”. Atualmente, nós temos cinco pessoas com deficiência em nosso quadro de funcionários e todos eles desempenham muito bem as suas funções”, finaliza.

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